Pagode 90, Lotação e McLanche Feliz

Felipe Porto
2 min readFeb 18, 2021

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Ouvindo “Maça do Amor” do Soweto, lembrei de um sábado corriqueiro, mas que eu considerava perfeito nos anos noventa, que hoje é só nostalgia trazida pela voz do Belo.

Parque Savoy City, zona leste de São Paulo, a feira acontecia todo sábado na rua de casa, minha mãe ia cedo pra garantir o que ela dizia ser a melhor hora da feira, eu ficava sendo tutelado pelo SBT, Sábado Animado, dispensa explicação. A feira garantia o almoço, a base de um pastel de frango e metade de um de carne, que vinha de brinde e eu dividia com meu irmão. Do lado da barraca da Japonesa dos pastéis (clichê clássico) tinha a barraca dos CD’s, onde outras vozes, além do Belo, também eram presentes, Chrigor, Rodrighinho, Vavá, Waguinho e tantos outros talentos que faziam a trilha sonora do almoço de todo mundo por ali. Do outro lado, tinha o ponto de ônibus, onde de cinco em cinco minutos passava uma Kombi ou Topic e o cobrador abria a porta e gritava: “Shop Aricanduva! Campo do torto!, Avenida dos Latinos! Santa Terezinha! Boooraaa!

Uma vez por mês, em média, minha mãe levava eu e meu irmão no shopping, o compromisso era pagar o cartão da C&A, mas sempre rolava um agrado pra gente com aquele McLanche Feliz esperto, para cravar essa alegria era preciso escolher entre duas opções de transporte, a primeira — e que demorava demais pra passar — era o ônibus 3032 Terminal Vila Carrão-Circular, que garantia uma viagem mais longa, mais confortável e sem incertezas sobre o trajeto, o que já não era o caso da nossa segunda opção. Nos anos noventa, as linhas de lotação em São Paulo, principalmente nas periferias, eram em sua maioria clandestinas, o que praticamente obrigava todas elas a terem um rádio PX, onde se comunicavam entre si, pra tentar fugir da fiscalização, então era comum uma fuga em velocidades interessantes ou um desvio de rota para umas ruas de terra, o que atrasava a viagem, mas isso era divertido demais, principalmente para uma criança de 8 anos, ainda mais quando tudo acontecia ao som de Exaltasamba, Katinguelê, Negritude Junior, Grupo Raça, Os Travessos e outros, mas sempre na Gazeta FM (a primeira).

O pagode 90 está pra além do gosto musical, tá preso na minha história, não é uma questão de gostar ou não, ele simplesmente está lá, quando tocar Inaraí, Temporal, Coral de Anjos, Gamei, Timidez…Não importa, eu vou cantar como uma simples resposta cerebral e emocional.

Reparem que não citei Raça Negra, foi de propósito mesmo, Raça Negra é domingo, Fiat Tipo e almoço na minha tia na Zona Norte, isso é outro texto.

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